Uma mulher viúva que tem um filho menor. Essa mulher trabalha numa Instituição Particular de solidariedade social, auferindo um salário mensal no valor de 483 euros.
Foi este o caso que a RTP decidiu trazer a público no dia 1.10.2008 para o programa “Grande Reportagem” a propósito das dificuldades financeiras sentidas por essa família. Ao que nos foi dito no dia seguinte pela mesma estação de televisão esse caso terá chocado a opinião pública, de tal forma e com tal intensidade ética que nesse mesmo dia terão chegado imensas ofertas, desde roupas e alimentos, até uma casa para passar férias.
Quanto ao facto de a televisão pública ter escolhido a apresentação deste caso para um programa que passa depois da hora de jantar, surpreende, mas não espanta. Surpreende, sobretudo, porque nesse dia, como nos anteriores, o grande tema de debate e de discussão pública e política foi a crise nos mercados financeiros. Simples coincidência…
O que não é coincidência, pela contradição que evidencia é, com certeza, o facto dessa mulher trabalhar numa Instituição de Solidariedade Social e ter sido necessário um programa de televisão para que finalmente sentisse alguma solidariedade. Devo pois colocar a possibilidade de que o nível de pobreza em Portugal (e, portanto, o número dos que precisam da solidariedade nacional, pública ou privada), é muito pior do que o que nos dizem os dados estatísticos que diariamente nos chegam. Coloco esta hipótese no pressuposto de que a instituição de solidariedade social onde trabalha essa mulher pratica a solidariedade com sentido de justiça e que, por via disso, não reparou nas dificuldades por que estava a passar a sua funcionária, já que tinha situações bem mais graves para acudir.
Ou então esta hipótese é completamente falsa, porque a verdade é que, ao que parece, nas sociedades contemporâneas a solidariedade não é para dirigir aos que nos estão próximos, mas sim aos que nos são distantes, aos que não se conhecem. Talvez por isso o caso agora tornado público tenha tido tantas manifestações de solidariedade.