20 março 2009

Perguntas Em Contraluz - VII

Hoje em dia, para onde quer que nos viremos encontramos devedores, sejam eles indivíduos, empresas ou Estados. Onde estão os credores? Quem são?

16 março 2009

Crise inesperada ou programada?

A complexidade de alta intensidade que caracteriza as sociedades contemporâneas coloca dificuldades acrescidas à previsibilidade da conduta humana. Cada vez é mais difícil (se é que alguma vez foi fácil e até mesmo possível) prever as consequências de determinada atitude ou de certo comportamento. É o que usualmente se designa de "efeito concertina" do comportamento dos humanos. A crise económica e social que estamos a viver pode, portanto, ter resultado dos efeitos inesperados e indesejados de uma fase de desenvolvimento do capitalismo marcada pela especulação sem limites e que nessa medida terá traído os próprios especuladores. Mas também pode ter resultado de efeitos inesperados e há vários anos constatados, mas que, entretanto, se tornaram desejados e que rapidamente foram aproveitados e deliberadamente ampliados para repor o equilíbrio do sistema que estava a sofrer demasiado ruído, sobretudo vindo das economias da Ásia e do Brasil, das designadas economias “emergentes”. Esta última hipótese ganha consistência à medida que a crise avança e as notícias parecem confirmar que, afinal, já muita gente sabia, menos o cidadão comum, que eram muitas as empresas, entre elas algumas multinacionais, que estavam a manter artificialmente a sua produção, que anunciavam dividendos que agora se confirma que não eram reais, etc. A ser confirmada esta hipótese é de esperar que a saída desta crise não traga, afinal , nada de novo. Quem estava à espera que o momento que estamos a viver pudesse servir para motivar uma reflexão sobre os caminhos trilhados pelo capitalismo nos últimos anos, desiluda-se. O que as ultimas notícias sobre os muitos fóruns nacionais e internacionais que se realizaram e outros tantos que estiveram anunciados mas que acabaram por ser cancelados deixam prever é que todo esse frenesim politico e diplomático mais não pretende do que deixar tudo como dantes: a matriz do sistema económico não será apenas mantida mas reforçada nos seus contornos mais agressivos; continuará a ser difundido o discurso dos benefícios inquestionáveis da competitividade, mesmo sem limites; enfim, com pequenos ajustamentos será, no essencial, mantida a lógica do comércio internacional. Mas afinal para que serve uma crise?

09 março 2009

As promessas de criação de emprego

Quem estiver atento às promessas que nos últimos meses foram feitas para a criação de novos postos de trabalho em Portugal não terá razões para estar pessimista quanto ao futuro e, muito menos, quanto à saída airosa da crise em que nos encontramos. De facto, nos últimos meses, quer o governo quer as autarquias não param de anunciar acordos e parcerias de investimento cujo propósito fundamental é a criação de postos de trabalho. Ontem foi a Câmara Municipal de Portimão que anunciou que vai ser criada no concelho uma fábrica que irá gerar 350 postos de trabalho directos, segundo as primeiras notícias, cerca de 250, segundo as notícias mais recentes. Mais cem menos cem, pouco importa para o caso. O importante é que vão ser criados novos postos de trabalho em Portugal, coisa rara, pelos vistos, tal é a relevância que esse anúncio obteve na comunicação social.
Ainda que se trate de anúncios a longo prazo, alguns a dez anos, sempre valerá a pena anotar as promessas agora feitas para verificar se serão ou não cumpridas. É claro que para isso é necessário ter paciência e sobretudo ter capacidade para encontrar surpresas, pois estou convencido que grande parte dessas promessas não só não serão cumpridas, mas fundamentalmente visam objectivos estranhos aos propósitos anunciados, desde estratégias eleitorais até formas de ultrapassar constrangimentos legais para favorecer clientelas locais. Com efeito, e como é sabido, a criação de emprego constitui muitas vezes um argumento para que algumas autarquias consigam não respeitar os PDM, procedendo a alterações pontuais, mas que acabam por ser cruciais para o modelo de organização e de desenvolvimento de um território. É, portanto, previsível que em momento de crise esse argumento suba de tom e também aumente o número dos que o aplaudem.

05 março 2009

País de brandos costumes ou país ridículo?

Noticia o Sol que uma mãe matou um filho obrigando-o a ingerir uma dose mortal de um medicamento. Aparentemente, o homicídio deveu-se ao facto de a mãe acreditar que a criança tinha sido a principal causa do seu abandono pelo seu companheiro.
O Tribunal da Relação de Lisboa, baseado numa avaliação psicológica que afirmava que no momento de matar o seu filho a mãe estava profundamente deprimida, acaba de confirmar a sentença de pena suspensa para a dita mãe (atente-se bem: a mulher não foi considerada inimputável, mas simplesmente deprimida) . O Tribunal da Relação recomendou também acompanhamento psicológico ou psiquiátrico regular, mas como deixou a mulher regressar ao Brasil, de onde é originária, abdicou da capacidade de supervisionar a efectivação de tal acompanhamento.
Os juízes do Tribunal da Relação parecem crer que, no momento em que matam alguém, as pessoas estão generalizadamente alegres, felizes, tranquilas e de bem com a vida.

02 março 2009

Política educativa?

Menos de uma semana depois de o gabinete de imprensa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior ter noticiado que «Até Dezembro de 2008 tinham sido concedidos cerca de 5.500 empréstimos pelo sistema bancário ao abrigo do Sistema de Empréstimos a Estudantes do Ensino Superior com Garantia Mútua», José Sócrates vem anunciar bolsas de estudo para estudantes entre os 15 e os 18 anos e a obrigatoriedade da frequência do pré-escolar. Junte-se a isto o novo regime jurídico das instituições do ensino superior e a sua tendencial privatização, a guerra longa e desgastante entre o Ministério da Educação e os professores, o frenesim dos rankings, etc. e podemos perguntar: alguém encontra alguma coerência nisto tudo? Pode isto chamar-se de política educativa?