09 dezembro 2008

O Estado: de renegado a desejado

Desde finais dos anos oitenta do último século que assistimos, pelo menos no designado mundo ocidental, a críticas ferozes contra a intervenção do Estado, sobretudo na relação entre os agentes económicos. Dizia-se então que o Estado deveria ser apenas um árbitro em caso de conflito, sendo certo que eram accionados todos os mecanismos de controlo, incluindo os de iniciativa estatal, para evitar que esses conflitos pudessem ocorrer. Em Portugal, foi com a chegada ao poder de Cavaco Silva (1985) que se ouviu repetidamente a frase “menos Estado, melhor Estado". Sem que a maioria dos Portugueses tivesse compreendido o pleno sentido e o total alcance de tal expressão, esta foi vulgarmente traduzida e depois entendida como o retirar do Estado de um conjunto de domínios que deveriam ficar à responsabilidade dos vários actores sociais. É claro, pelo menos hoje, que não era essa a intenção, já que o Estado reduziu de facto a sua acção em alguns sectores, como foi o caso das políticas sociais, mas continuou a intervir activamente na economia. Fê-lo, é certo, de forma discreta, designadamente na criação de condições estruturais que facilitassem o tão apregoado e ainda mais desejado desenvolvimento económico. É que, segundo essa perspectiva, é na empresa e nos empresários que as sociedades contemporâneas encontram o seu terreno firme, ou seja, o seu fundamento e a sua sustentação. Aliás, quase arriscaria a dizer que se instalou nos últimos anos em Portugal, e não só, uma quase cultura do empresariato, tese que poderia ser sustentada recorrendo, por exemplo, ao número de iniciativas e mesmo de acções de formação que foram promovidas em empreendedorismo, a que alguns decidiram chamar social.
Neste ambiente de culto da empresa, os seus actores, desde logo os empresários, não se cansaram de reclamar contra a excessiva intervenção do Estado e quase sempre foram respeitosamente ouvidos. Foi assim que, apenas a título de exemplo, se podem referir as decisões que foram tomadas para a crescente flexibilização das relações laborais. Mesmo assim estamos hoje confrontados com uma crise económica que quase todos, desde políticos a empresários, consideram de grandes proporções. Mais uma vez políticos e empresários estão de acordo quanto à condição necessária (e talvez suficiente) para a solução a encontrar para a saída desta crise: mais intervenção do Estado, sendo que agora já não apenas na criação de condições estruturais mas na ajuda directa às empresas, a começar pelas do sector bancário, é claro, já que a economia foi nos últimos vinte anos sustentada, quase exclusivamente, no sector financeiro. É caso para dizer que muitas voltas dá o mundo, mas por mais voltas que dê alguns estão sempre no mesmo sítio.

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